2012-07-20 08:03:00
A Polícia Federal de Ponta Porã/MS concluiu nesta semana a segunda fase das investigações do inquérito policial que foi instaurado para apurar os crimes decorrentes do ataque ao acampamento indígena Guayviry, situado no município de Aral Moreira/MS, ocorrido no dia 18/11/2011, em que figurou como vítima o cacique Nízio Gomes, tendo o inquérito policial sido novamente encaminhado ao Ministério Público Federal.
No total foram 23 pessoas indiciadas, das quais 18 estão presas por mandados de prisão preventiva em vista de seus indiciamentos pelos crimes de homicídio qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e corrupção de testemunhas. Houve ainda o indiciamento de um funcionário da FUNAI pelos crimes de quadrilha e coação no curso do processo, haja vista ter tentado coagir uma importante testemunha a mudar seu depoimento na polícia. Como o caso ainda tramita em segredo de justiça, os nomes dos indiciados não serão divulgados pela Polícia Federal, assim como detalhes específicos sobre as investigações.
Dentre os presos, 10 pessoas são ligadas a uma empresa de segurança privada da cidade de Dourados/MS, incluindo seu proprietário e gerentes e 06 são fazendeiros da região de Ponta Porã/MS e Aral Moreira/MS. Um destes fazendeiros é presidente de um Sindicato Rural no Estado de Mato Grosso do Sul, havendo também 01 advogado do Paraná dentre os presos.
Como já divulgado anteriormente, as novas provas colhidas pela Polícia Federal apontam que efetivamente o cacique Nízio Gomes foi morto no acampamento e seu corpo teria sido levado do local em uma caminhonete, sendo os executores do ataque as pessoas vinculadas à empresa de segurança privada de Dourados/MS. Após isso, o corpo do cacique Nízio Gomes teria sido ocultado pelos fazendeiros que atuaram como “mandantes” do ataque aos índios.
O local onde está o corpo do cacique ainda está sob investigação da Polícia Federal. Pelo que consta, alguns dos fazendeiros presos sabem exatamente onde o corpo estaria escondido, no entanto nenhum deles demonstrou interesse em colaborar com as investigações e informar o local em que teriam ocultado o corpo.
Ao que parece, este seria um dos principais motivos que justificariam o prolongamento das prisões, pois, se mesmo estando presos a estratégia até agora utilizada pelos fazendeiros está sendo a de negar qualquer envolvimento com os crimes (apesar de entrarem em contradição com outras provas produzidas), estima-se que se postos em liberdade o corpo dificilmente será encontrado dada a vastidão de áreas não habitadas nesta região de fronteira com o Paraguai.
Após a morte do cacique Nízio e a ocultação do seu corpo, alguns dos fazendeiros indiciados tentaram se utilizar de técnicas escusas para dificultar o trabalho da polícia, chegando inclusive a contratar um indígena de outra aldeia para fingir que estava ajudando nas investigações, mas na verdade estava passando informações erradas.
Os fazendeiros e o advogado (preso) orientaram referido indígena a dizer para a Polícia Federal que o cacique Nízio estava vivo e morando com familiares em uma aldeia no Paraguai, pois na visão deles a polícia nunca iria ter como checar estas informações e com isso iria sempre perdurar a dúvida sobre sua morte.
Entretanto, após um intenso trabalho de investigação, os policiais conseguiram provar ao indígena que ele estava indicando pistas falsas, momento em que ele resolveu falar a verdade de que Nízio Gomes estava morto e que ele havia sido contratado pelos fazendeiros para tentar ludibriar a polícia. Em troca, os fazendeiros prometeram a ele uma grande quantia em dinheiro (uma parte pequena foi efetivamente paga) além da contratação de um advogado, caso fosse necessário, e ainda fizeram a promessa de que iriam adotar as providências necessárias para elegê-lo vereador nestas eleições.
Antes do ataque ao acampamento Guayviry, este mesmo indígena tinha sido contratado pelos fazendeiros para tentar negociar com o cacique Nízio Gomes a saída do seu grupo em troca do pagamento de uma grande quantia em dinheiro, mas como o cacique não aceitou, os fazendeiros resolveram contratar a empresa de segurança privada para realizar o ataque ao acampamento.
As armas utilizadas no ataque ao acampamento Guayviry foram fornecidas pelos fazendeiros e trataram-se de espingardas calibre 12, com munições classificadas de “menos letal”, entretanto vale ressaltar que se o disparo for feito em curta distancia ou se for utilizada de maneira inadequada, pode ser tão letal quanto uma munição comum.
Uma das pessoas presas que participou da execução do ataque ao acampamento confessou em interrogatório que o cacique Nízio foi atingido por um disparo na região subaxilar e que ele havia participado da retirada do corpo do local do ataque, tendo inclusive verificado o seu pulso e constatado a efetiva morte do índio. Este indiciado esclareceu, inclusive, que houve pouco sangramento do cacique Nízio, o que se coaduna com o que foi descrito no laudo pericial de que havia pouco sangue no local dos fatos.
A Polícia Federal ainda está promovendo diligências no intuito de encontrar o corpo de Nízio Gomes.
Durante todo o período de investigações, a Delegacia de Polícia Federal de Ponta Porã/MS recebeu reforço de policiais no contexto da Operação Sentinela para atuar no caso do ataque ao acampamento Guayviry.
Os fazendeiros e o advogado encontram-se presos na Delegacia de Polícia Federal de Ponta Porã/MS, havendo previsão de suas remoções nesta sexta-feira (20/07/2012) para Estabelecimentos Prisionais no Estado.
Acredita-se que o resultado das investigações no caso da morte do Cacique Nízio Gomes tenha sido um marco no que pertine à forma de resolução dos conflitos pela posse de terras entre indígenas e fazendeiros, pois anteriormente nunca tantas pessoas tinham sido indiciadas e presas no Estado de Mato Grosso do Sul por terem se utilizado da violência para tentar expulsar indígenas da área de fazendas invadidas, servindo como paradigma de que a melhor forma é sempre buscar os meios legais existentes para qualquer resolução de conflitos.