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Reforma do ensino médio não deve ser feita "na caneta", dizem especialistas

2016-09-22 19:01:00

A medida provisória que muda a estrutura do ensino médio, anunciada pelo governo Temer na tarde desta quinta-feira (22), deveria ter sido discutida abertada com a sociedade, afirmaram especialistas ouvidos pelo G1. A medida provisória entra em vigor assim que é assinada pela Presidência da República, mas o Congresso Nacional tem 120 dias para fazer a análise do texto, propor mudanças e aprová-lo.

Entre as mudanças anunciadas estão o aumento do tempo de permanência dos estudantes na escola e a grade de disciplinas obrigatórias, que será reduzida para promover a "flexibilização" do currículo. Diretores, coordenadores e especialistas que conversaram com o G1 consideraram as modificações precipitadas. “Não é algo a ser resolvido com uma caneta”, afirmou Débora Cristina Jeffrey, coordenadora do curso de pedagogia da Unicamp.

Veja abaixo as considerações feitas por especialistas sobre o assunto:

Débora Cristina Jeffrey, coordenadora do curso de pedagogia da Unicamp

“Eu particularmente não concordo, ainda mais da forma como está sendo realizada, via medida provisória, desconsiderando a discussão que foi feita. É um caráter emergencial e irrevogável que vai ter consequência direta. Não compreendo. A partir do momento em que a lei vá ser aprovada por medida provisória, para depois ir para o Congresso, tem ingerência grande em todo o processo de discussão das últimas décadas no Brasil. Fizemos conferências, debates em torno do Plano Nacional de Educação, que acabou de ser promulgado, diretrizes para a formação de professores da educação básica, discussão da base curricular, que também não foi finalizada. Não é uma medida provisória que vai resolver. Existe um primeiro diagnóstico que aponta evasão e desinteresse dos estudantes, a própria pesquisa da geração ‘nem nem’ mostra isso. Não concordo. Ela pode trazer problemas muito sérios, em vez de melhorar, pode piorar. Você tem professores de química, física, como que isso vai resolvido? Como fica a relação com o governo federal?

Ouviram secretários estaduais de educação, eles compreenderam como isso vai acontecer? Fere os princípios da LDB e da Constituição. Não é algo a ser resolvido com uma caneta. O processo de contratação dos docentes… Questões estruturais, políticas e de legislação que não têm sido consideradas. Estão criando outro problema. Não é com a caneta que isso se resolve. O que vai fazer com o tempo integral? É só um tempo para não ficar na rua? Há essas questões de fundo.”

Eduardo Deschamps, presidente do Conselho Nacional de Dirigentes Estaduais de Educação (Consed)

"O Consed, desde 2012, vem apresentando propostas em parceria com técnicos, professores, estudantes, representantes da sociedade. Ao longo desse período, apresentou pelo menos três propostas incorporando alterações de currículo, flexibilização e tempo integral. Agora, o MEC acatou a maioria das nossas demandas. Não temos mais como adiar a reforma do ensino médio, é urgente, é prioritária. Quem sofre com a demora em implantar essa reforma são milhões de jovens brasileiros que não encontram sentido no ensino médio. A sociedade sofre, porque o Brasil precisa, em todas as áreas, de cérebros sintonizados com o século 21."

Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

"Não vai resolver o problema do ensino médio. Há ideias boas, como a flexibilização, mas sem qualquer mudança em questões estruturais, como: uma nova prática pedagógica, uma escola com infraestrutura adequada, a redução do número de alunos por turma, a valorização dos profissionais da educação. Se não gerasse um impacto enorme na reorganização das redes públicas, seria uma reforma cosmética, baseada em um boa ideia – a flexibilização –, mas sem sustentação, pois não envolveu professores e, principalmente, estudantes que ocuparam escolas. Então, é um castelo de areia com dois problemas: Primeiro, abre espaço para malfeitos com recursos do FNDE – que perde mecanismos de controle. Segundo, tornar integral o ensino médio, com mudanças apenas no percurso do estudante tende a ser contraproducente. Além disso tudo, o Art. 36º, parágrafo nono, abre espaço demasiado para parcerias público-privadas."

Sônia Magalhães, diretora-geral do Colégio São Luís, em São Paulo

“A reorganização do ensino médio proposta na medida provisória me parece precoce. Mais eficaz seria aguardar a finalização do trabalho de construção da Base Nacional Curricular Comum e, após essa definição, discutir sobre a estrutura mais adequada para o desenvolvimento do currículo, não apenas no ensino médio, mas em toda a educação básica. Essa me parece uma incoerência de fundo. Além disso, penso que já temos suficiente flexibilidade na atual Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional, assim como a indicação do trabalho por áreas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. O que tem nos faltado é capacidade de implementação do que está proposto nestes dois documentos, inclusive no que toca à formação universitária dos professores. Com o dito e divulgado até agora, não consigo ver o que pode haver de qualitativamente importante nesta medida provisória.”

Esther Carvalho, diretora-geral do Colégio Rio Branco, em São Paulo

"Há tempos sentimos que o ensino médio necessita de outros propósitos. David Perkins, professor da Universidade Harvard, ao discutir o conceito de currículo necessário para o mundo contemporâneo, traz o termo 'gap de relevância' com relação a esse segmento. Por outro lado, fica bastante claro que o que define o currículo do ensino médio no Brasil é o processo seletivo ao ensino superior. No Estado de São Paulo, por exemplo, um vestibular que tem muito impacto no desenho do ensino médio é a Fuvest. Enquanto a Fuvest tiver a lista enorme de conteúdos que hoje apresenta para seu processo seletivo, as escolas de ensino médio que têm por objetivo que seus alunos sejam bem sucedidos nesse vestibular, terão que trazê-los para dentro da sala de aula. Enquanto conceito, a proposta de mudança nos parece muito interessante. Traz flexibilidade curricular, atendendo diferentes perfis e projetos de alunos. Traz também, novos desafios de desenvolvimento profissional aos educadores para que os objetivos sejam alcançados. Em termos de políticas públicas, o trabalho com os educadores precisa ser bem elaborado e implementado. No país, o Enem não é o único exame de acesso ao Ensino Superior. Haverá impacto significativo se o Enem se transformar em componente curricular obrigatório ao Ensino Médio, como é o Enade para o ensino superior. A previsão é que os primeiros alunos a serem afetados pelo novo formato sejam os que iniciarem o ensino médio em 2018, segundo o Ministério da Educação (MEC). Durante o ano de 2017 devemos trabalhar para desenvolver e detalhar as diversas etapas para que esse modelo seja bem sucedido. Precisamos ter cautela para estabelecer um processo de transição em que os alunos possam usufruir da nova proposta de forma que ela traga, efetivamente, mais ganhos do que perdas."

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